Foto Arte 1: Pictorialismo

 A fotografia foi apresentada oficialmente ao mundo em 1839, na França. Com ela, veio o debate sobre o caráter artístico de uma imagem gerada por técnicas industriais. O receio de que a fotografia substituísse a pintura fez com que nomes importantes tecessem duras críticas ao novo formato.
O filósofo Baudelaire e, posteriormente, os simbolistas, defendiam que a arte era uma atividade espiritual que não poderia ser substituída por algo mecânico. De fato, antes do preparo dos homens para uma cultura fotográfica (na qual o mundo é aprisionado e altera as relações de tempo e espaço), fotógrafos e retratados costumavam tomar por referência o enquadramento e as funções da pintura, gerando imagens pouco criativas em relação a uma tela (o que, de certa forma, se repete até os dias de hoje). Com o advento das propostas modernistas, porém, a pintura encontrou um novo caminho (que iria dos Impressionismo até as diversas correntes da arte Abstrata) e a fotografia começaria a ser explorada em suas possibilidades técnicas.
Em meio a esse turbilhão de ideias, na segunda parte do século XIX,  surge o Pictorialismo, corrente que configura a primeira tentativa de elevar a fotografia à categoria de arte. Com intervenções manuais (como a aplicação de substâncias químicas no positivo da fotografia), os  fotógrafos pictorialistas buscavam efeitos de granulação, destaque de tons e supressão de elentos para que suas imagens de alguma forma se assemelhassem as imagens de pinturas ou aguarelas. 
Embora a fotografia nunca tenha sido uma representação neutra da realidade, havia uma forte crença  na sociedade recém-apresentada à captação industrial de imagens de que ela trabalhava com a verdade.
Os pictorialistas queriam romper com essa identidade, buscando mostrar o fotógrafo como criador do real apresentado.
A iniciativa, entretanto, acirrou a disputa com pintores, que se sentiram o perigo de serem substituídos. O romantismo e o sentimentalismo pictorialistas atraíram a maioria dos fotógrafos da época,  com a interessante característica de ter entre eles diversas mulheres, o que era incomum em outras  áreas da fotografia, nas quais os homens dominavam maciçamente. Alguns nomes de destaque do movimento foram Gertrude Kasebier, Alice Boughton, Anne W. Brigman e Julia Margaret Cameron - a maioria deles chegou a atuar em mais de um movimento ao longo da carreira.
A ingenuidade e pouca eficácia das propostas pictorialistas, entretanto, fizeram com que o movimento caísse em decadência já na virada do século XX, às vésperas da Primeira Grande Guerra Mundial, dando lugar ao chamado o Photo-Secession, que discutiremos no próximo post.
Para o crítico de arte Giulio Argan (1), "não há sentido em perguntar se [fotógrafos] 'fazem arte' ou não"; pois "não há qualquer dificuldade em admitir que os procedimentos fotográficos pertencem à ordem estética." No entanto, Argam ressalta "que as 'fotografias artísticas', tão em voga no final do século passado [XIX, no caso] e no início do século XX, são semelhantes às estruturas perfeitas em ferro ou cimento que os arquitetos 'estruturais' revestiam com um medíocre aparato ornamental para dissimular sua funcionalidade."
Ou seja, a fotografia pictorialista não se libertava da vergonha de ser fotografia, tão pouco representava algo mais que simples retratos feitos para atender o orgulho dos retratados - para superar isso, Argan defende que é necessário que a fotografia cesse de pedir a pintura que a torne artística e busque a fonte de seu valor estético na estruturalidade intrínseca à sua própria técnica.

Porém, independente das falhas conceituais, o Pictorialismo representou uma proposta de arte fotográfica e contribuiu significativamente para o estudo dos processos físicos e de composição da imagem fotográfica, ajudando a trilhar o caminho para o conhecimento dessas estruturas. Do ponto de vista estético, há ainda que se acrescentar a beleza hipnotizante para o olhar contemporâneo de algumas imagens pictorialistas, como as apresentadas abaixo:

  
    Retrato de "Miss N." por Gertrude Kasebier

                                                             Composição encenada de Julia Margaret Cameron

Dica: para complementar a questão do Pictorialismo, sugiro o texto O Pictorialimo Fotográfico e seu Contexto Histórico, do ótimo blog Mestrado Em Cultura Visual.

1 - ARGAN, G. Arte Moderna. 2.ed. Trad. Denise Bottmana e Federico Carotti. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. pp.80-81.